Mulheres negras e trans debatem sobre afirmação de direitos em seminário internacional
“Eu tinha muito medo de ser trans, de sofrer violência. Aí, eu vim aqui, meu primeiro seminário, e vi que tem outras mulheres trans lutando por direitos, por uma vida digna. Me senti acolhida, aprendi que
preciso ser respeitada”, relatou a estudante Luisa Helena, de 16 anos, moradora de Campo Grande, sobre o primeiro dia do seminário internacional de afirmação dos direitos das mulheres negras e
trans, promovido pela Secretaria da Mulher do Recife e pelo Gabinete de Representações e Relações Internacionais da prefeitura municipal. O evento segue até amanhã (16), com palestras e workshops com
transativistas e ativistas negras, no auditório do bloco G1 na Universidade Católica de Pernambuco (Unicap). O seminário é aberto ao público e conta com o apoio do Instituto Humanitas da Unicap.
A mesa de abertura foi composta pelo vice-prefeito do Recife, Luciano Siqueira, o Padre Clóvis Cabral, representando a Unicap; o Cônsul do Reino Unido, Graham Tidey; a representante do Conselho Municipal
da Mulher, Irani Cordeiro; o secretário do Gabinete de Representações e Relações Institucionais do Recife, Antônio Barbosa; a representante da Secretaria da Mulher de Pernambuco, Beatriz Vidal, e a secretária
da Mulher do Recife em exercício, Ceça Costa.
Em sua fala, Luciano Siqueira reafirmou a importância da parceria da Prefeitura do Recife com o Consulado Britânico e comentou sobre a necessidade de discutir as temáticas pautadas pelo evento. “Saibam que
esse seminário que acontece hoje aqui faz parte dessa luta geral que nós estamos travando, diz respeito a uma temática que sempre foi objeto de preconceito e esse seminário é a resistência”. Além deste
evento, a parceria com o Consulado Britânico no Recife trouxe outros frutos como o festival de cinema LGBT.
A secretária em exercício, Ceça Costa, agradeceu as participantes e reforçou a importância do diálogo entre a sociedade e os órgãos públicos na construção de políticas de gênero. “Esse evento é para coroar que
a luta das mulheres que é uma luta cotidiana, é uma luta permanente. Estamos em um momento de muitos retrocessos e se não fossem as mulheres dos movimentos sociais que estão nas ruas de todo o pais,
estaríamos em uma situação muito pior. Por isso, queremos fechar essa gestão dizendo que queremos sim debater temas que são difíceis, mas que são muito necessários. Vamos dialogar, Estado, sociedade e
academias em prol de todas as mulheres”, finalizou.
PALESTRAS - A primeira mesa trouxe um comparativo e uma troca de experiências entre as políticas de gênero que são aplicadas no Reino Unido e o funcionamento dessas ações na gestão municipal do Recife.
A Assessora de Direitos Humanos da Embaixada Britânica, Beatriz Sanutti, comentou que o Reino Unido está em terceiro lugar dos 49 países europeus que mais atuam nas questões de Direitos Humanos e,
especificamente, nas ações voltadas para a população de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Intersexo (LGBTTI). Além disso, o país também se destaca pelo suporte legal que oferece às pessoas
que queiram tirar o nome social e passar por cirurgias de mudanças de sexo.
No Recife, as políticas foram apresentadas pela secretária da Mulher em exercício, Ceça Costa. Em sua fala, a gestora destacou os marcos legais como a criação da Secretaria da Mulher, em 2013, os planos
estaduais e municipais de enfrentamento à violência de gênero e a transversalidade das políticas como peça fundamental para a promoção da igualdade como é o caso da ação Maria da Penha vai à Escola.
Também foram destacados os trabalhos do Hospital da Mulher com o ambulatório LBT, o combate ao racismo institucional e o reconhecimento do papel fundamental do movimento de mulheres no Recife na
atuação e no controle das políticas públicas.
Gênero e sexualidade em uma construção social e eliminação da visão bionormativa foi o tema da segunda mesa. Foram convidas para debater o assunto a turismóloga e transativista, Heymmilly Maynard e a
técnica em educação da diretoria LGBT da UFPE, Geovana Borges. A mediação da mesa foi da transativista Fernanda Falcão. A primeira a falar foi Geovana que trouxe os desafios e as conquistas das trans
como o direito ao nome social e o uso do banheiro, na UFPE, de acordo com o gênero. “ Eu acho que a gente precisa muito quebrar mais muros, criar novos mecanismos. Espaços como esse seminário ajudam
muito nisso, faz salientar a necessidade do debate”, comentou.
Já Heymmilly, trouxe os dados da Rede Trans Brasil que apontam que, a cada 26 horas, morre uma mulher trans no Brasil. A transativista também acentuou a importância de se discutir gênero e sexualidade
nas escolas para combater a transfobia e a exclusão das trans no mercado de trabalho. “O que temos hoje aqui é uma mesa histórica. Essas três mulheres concluíram o ensino médio, estão empregadas. Mas
essa não é uma realidade das travestis e transexuais, somos empurradas para a prostituição, vivemos em uma sociedade opressora, que nos mata”, completou.
WORKSHOPS – No período da tarde, diversas mulheres participaram dos workshops. Os temas debatidos pelas transativistas convidadas foram: gênero e sexualidade- uma construção social; direitos humanos
e cidadania são princípios e garantia de saúde mental; empoderamento do corpo da mulher transexual em visão assistencial; violência institucional sofrida pelas mulheres trans; o que é ser uma mulher
transexual na visão escravocrata da nossa atualidade. Em cada sala, foram disponibilizadas 20 vagas.
A estudante de serviço social e travesti Amanda Palha realizou o workshop sobre empoderamento do corpo na visão da assistência social. A ativista trouxe a relevância de profissionais bem treinados na
assistência com o objetivo de atender e acolher a usuária trans ou travesti. “ O seminário foi uma iniciativa muito importante e que precisa ser explorada mais vezes. Também queria fazer um destaque da
importância de trazer para esse espaço pessoas que são do movimento e que estão atuando na militância”, disse.
PROGRAMAÇÃO - A programação do dia 16 começa às 8h30 com a palestra "Afirmação dos Direitos das Mulheres Negras", com a professora da Unicap, Waldenice Raimundo. A partir das 9h30, têm início os
workshops sobre mulheres negras em quatro salas temáticas. À tarde, às 14h30, professora da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Fabiana Moraes, e a secretária de Direitos Humanos e Cidadania de
São Paulo, Djamila Ribeiro, conversam sobre "Empoderamento das Mulheres Negras e Transgêneras em Tempos de Crise". O encerramento do evento será às 18h30 com um coquetel regional e apresentação
cultural do Balé Nagô Ajó.
No segundo dia dos workshops, o tema é mulher negra. Os quatro conteúdos serão comunicação na web e combate ao racismo; racismo e sofrimento psíquico, empoderamento negro aliado ao fortalecimento
sociopolítico e produtivo das mulheres na perspectiva da economia solidária; saúde da mulher negra e afirmação dos direitos; autodefesa na perspectiva racial. Os debates têm início às 9h30 e segue até às
12h30. Serão disponibilizadas 20 vagas para cada sala temática. As inscrições são gratuitas e podem ser realizadas no local.